Testemunhos de Olívia Nogueira e Lino Borges Gonçalves, Arganil
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Testemunho recolhido numa conversa com Olívia Nogueira e Lino Borges Gonçalves, durante um passeio pelo centro de Arganil com a
investigadora Ivonne Herrera Pineda, em maio de 2023.
Olívia Nogueria é antiga professora do ensino primário e grande conhecedora da história local de Arganil. Lino Borges Gonçalves conhece bem Arganil e também Côja pela sua trajetória pessoal. Do projeto Arquitectura Aqui expressamos os nossos sinceros agradecimentos por toda a vossa gentileza e generosidade em colaborar connosco. Salientamos a nossa gratidão à professora Olívia Nogueira, por ela ter encontrado um tempo para esclarer a informação aqui apresentada.
Seguem-se algums excertos desta conversa, onde podemos compreender a história e transformações de vários dos equipamentos estudados em Arganil:
Câmara Municipal, CTT e Tribunal
- Olívia Nogueira: “Toda esta zona, a partir de aqui, era uma zona de casas rústicas, de aspecto pobre e escuro [nessa época havia uma certa elite de proprietários e gente de dinheiro]. Eram casas muito muito antigas que davam para os terrenos que iam até ao ribeiro de Amandos -mais tarde coberto, dando origem à Avenida. Foram demolidas para se construir… Em 1940 foi inaugurado [edifício dos] Paços do Concelho, a Câmara Municipal.
- Lino Gonçalves: [sobre a Câmara] Já foi uma arquitetura do Estado Novo. E depois pouco mais tarde foram construídos os Correios -que são completamente Estado Novo.
- Olívia Nogueira: E para isto ser construído, todas as outras casas foram deitadas abaixo. Aqui nesta zona havia a cadeia e o tribunal. Então tudo isto, mesmo assim, o tribunal agora tem edifício próprio, mas chegou a funcionar na Câmara.
- Lino Gonçalves: Durante muitos anos, eu ainda me lembro disso, na Câmara [o tribunal].
- Olívia Nogueira: Chegou a funcionar na Câmara”.
Câmara Municipal [o edifício e a zona]
Segundo a professora Olívia Nogueira, os Paços do Concelho foram construídos no local onde era a antiga cadeia.
Olívia Nogueira: [O edifício da Câmara] “foi feito de raiz e houve uma polémica com o local onde [a Câmara] ia ser construída, porque havia pessoas que queriam que ela fosse construída lá no alto, no Paço, e outras pessoas que queriam que ela fosse construída aqui. E ganhou esta parte por ser mais central".
A professora Olívia Nogueira descreve esta área [a praça e os seus edifícios] como “a zona mais central de Arganil”. Ali passava a estrada que vinha de Gois e ia dar à Barreira, Coja... Ela refere também que as farmácias, que estão próximas, eram centros de encontro social e cultural:
“Nas farmácias havia tertúlias. Uma das farmácias era aquela do lado esquerdo, aqui havia as tertúlias de pessoas mais trabalhadoras, que eram trabalhadores rurais, não eram as tertúlias chiques” […] Na farmácia Galvão era onde se faziam as tertúlias
- As tertúlias chiques? [investigadora]
– Sim! Tertúlias de classes mais altas.
Antes de ser construído o edifício da Câmara essa zona já era o centro da vila. Havia uma arvore que era chamada “a Pimenteira”. “A pimenteira era uma arvore típica. Dava sombra e as pessoas vinham aqui, tinham um banco e sentavam-se ali…”.
Lino Gonçalves também menciona que “estamos a chegar ao coração do Arganil, não é? O que também prova a proximidade das pessoas com mais poder económico estar mais… junto ao centro político”.
Edifício dos Correios
De acordo com Olívia Nogueira, os edifícios que estavam localizados onde hoje estão os CTT foram demolidos para a construção do novo edifício.
Quartel dos Bombeiros
Olívia Nogueira: Nos anos 40, “aqui não havia Bombeiros aqui, não havia nada. Por tanto, só havia umas casas que davam para
os quintais [...] também havia casas até a avenida”.
Tribunal
- Investigadora: As famílias senhoriais tinham relações com as fábricas de serração?
- Olívia Nogueira: Não, não! Essas famílias senhoriais só tinham relações com os tribunais, com a Câmara. As outras eram uma classe mais baixa, que eram os marceneiros.
- Investigadora: E com a cerâmica também?
- Olívia Nogueira: Com a cerâmica também
Outras questões - Passado agrícola da sede do concelho
[Zona da avenida Forças Armadas] A gente que estava aqui a cultivar eram os donos da fábrica de serração, e venderam esses terrenos para construir a avenida: “Eram todos terrenos de cultivo e eram regados por duas ribeiras que vêm do rio Alva […] Eram campos de cultivo, aqui não havia casas, não havia nada [...] havia aquela estrada de cima que [levava] a Côja” [Olívia Nogueira].
[Zona da avenida Forças Armadas] A sede do concelho era um espaço pobre e agrícola (cultivo de batatas, couves e milho). As pessoas comuns dedicavam-se à agricultura, aos seus quintais, trabalhavam também nas fábricas ou eram proprietários de pinheiros [Olívia Nogueira].
O resineiro era um indivíduo que ia recolher a resina (pagava a resina ao dono do pinheiro) [Olívia Nogueira].
“A agricultura era a base [...] este era um meio pobre que vivia essencialmente da agricultura. – agricultura e da cerâmica! [Lino] – E da cerâmica. E por isso depois tiveram que... por isso havia muita emigração, precisamente porque não havia maneira das pessoas se sustentarem se não pelas fábricas, por essas três fabricas de moveis e pelas fábricas de cerâmica, que havia, na altura, duas”. [Olívia Nogueira].
Outras questões- Casas de particulares
Detalhes nas janelas: quando tinham caixilhos de granito, indicavam que a pessoa tinha mais dinheiro, pelo que algumas pessoas colocaram imitações de granito nas fachadas das casas. Era um elemento distintivo de classe [Olívia Nogueira].
A recolha e incorporação do testemunho oral foi elaborada
por Ivonne Herrera Pineda, com base numa conversa informal mantida durante um passeio em abril de
2023. As informações foram aperfeiçoadas a través de uma conversa realizada em julho de 2024.
Para citar este trabalho:
Arquitectura Aqui (2024) Testemunhos de Olívia Nogueira e Lino Borges Gonçalves, Arganil. Acedido em 23/11/2024, em https://arquitecturaaqui.eu/documentacao/notas-de-observacao-ou-conversacao/31797/testemunhos-de-olivia-nogueira-e-lino-borges-goncalves-arganil