Testemunho de Carlos Videira, Pinhel
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Conversa mantida durante uma visita à Casa do Povo de Pinhel em junho de 2023, com a investigadora Ivonne Herrera Pineda e o investigador Diego Inglez de Souza.
Visitámos a Casa do Povo, graças
à cortesia do seu presidente, Carlos Videira dos Santos, que nos abriu as
portas da Casa do Povo e nos acompanhou nesta visita. Gostaríamos de agradecer a sua amabilidade em facilitar esta visita e a realização do evento.
Carlos Videira foi Presidente da Junta de Freguesia de Pinhel de 2011 a 2017 e está intimamente ligado à Casa do Povo desde criança, tendo participado nas suas atividades ao longo da sua história. A sua personalidade levou-o a envolver-se em inúmeros projetos sociais ao longo da sua vida, tanto na área desportiva como cultural. Também é proprietário de uma loja de caça e pesca e de produtos locais.
Casa do Povo de Pinhel
Ao entrar na Casa do Povo, depois de passar o hall de entrada, o edifício divide-se em dois grandes compartimentos. À esquerda, desce-se uma rampa para chegar a um grande salão. À direita, há um corredor que liga várias salas. Esta ala direita tem uma parte mais antiga, com escritórios e casas de banho, e, nas traseiras, uma extensão mais recente, onde existe uma sala de reuniões.
A ala esquerda é a zona mais interessante, pois nela se concentra a maior parte das atividades desenvolvidas na Casa do Povo. A principal caraterística é uma grande e espaçosa sala de reuniões, com grandes janelas numa das paredes, tetos altos com um grande candeeiro pendurado e uma disposição do mobiliário que deixa livre o espaço central. Hoje vemos um insuflável nesta sala, porque recentemente houve um evento para crianças e esta sala foi alugada para esse fim. Das janelas vê-se o que era o campo de futebol.
A partir deste hall chega-se a outro módulo, onde se situava o serviço da Segurança Social e o posto médico, onde o médico vinha e dava consultas. Existem vários gabinetes, alguns deles adaptados para formação. Atualmente, este espaço está desativado.
Durante a visita, Carlos conta as experiências e os acontecimentos que foram ocorrendo ao longo do tempo nesta Casa do Povo. Abaixo estão algumas das experiências que ele partilhou:
O candeeiro é feito de ferro, e tem muita presença na sala. O candeeiro foi feito por pessoas de Pinhel de uma forma artesanal, pois não usavam soldadura. Esses trabalhadores eram chamados de ferreiros. O candeeiro foi desenhado por um arquiteto de Pinhel, o arquiteto Madeira, que foi também seu professor de desenho. Salienta o valor estético do candeeiro e o pormenor do desenho na forma das folhas de videira.
Vemos várias fotografias de pessoas que por aqui passaram penduradas nas paredes. Várias são fotografias dos membros da Filarmónica, vemos também desfiles e festas do rancho folclórico. A Filarmónica ensaiava aqui e tinha muito sucesso, a banda era muito grande e havia muita gente envolvida.
Aqui se realizavam campeonatos e atividades lúdicas e desportivas, como o futebol (no campo de futebol atrás), o ténis de mesa e atividades como o xadrez ou damas. As casas do povo participavam nos campeonatos nacionais em várias modalidades e recebiam medalhas e prémios, alguns dos quais podem ser vistos durante o passeio.
Havia um funcionário público carismático que fazia o presépio no Natal, que tinha muito sucesso. Também tinha muito sucesso a televisão e as pessoas viam programas como o Bonanza. Quando tinha cerca de 10 ou 12 anos, lembra-se de se sentar calmamente a ver televisão.
Quase nada resta das atividades que existiam há 50 anos. Por exemplo, as pessoas que participavam ativamente e dinamizavam a atividade têm agora 70 anos. Antes isto estava cheio de jovens e pessoas de todas as idades e muitas delas estavam dispostas a participar e a colaborar. "E tinha esta gente que andava por aqui, os mais velhos e os mais novos, vivíamos isto com alguma intensidade". Agora, por outro lado, "os miúdos não querem ver nada disto". No entanto, há vários grupos, uns conseguem sobreviver, outros não. Existe atualmente um grande grupo de concertinas.
Conta que um médico de Coimbra o reconheceu durante uma consulta médica, porque tinham jogado futebol juntos quando eram jovens no campo junto à Casa do Povo.
A Segurança Social funcionava no módulo que era uma extensão do edifício original da Casa do Povo (este acrescento foi feito nos anos 70, após o 25 de abril). Este serviço não tinha nada a ver com o resto das atividades que se desenvolviam na Casa do Povo. Os funcionários públicos trabalhavam ali e pagavam uma renda pela utilização do espaço à Casa do Povo. No mesmo espaço, foram adaptadas salas para a formação, para o centro de emprego, para a formação profissional, mas agora não são utilizadas.
Salienta a dificuldade de manter um edifício deste tipo com as despesas que implica.
Bairro da Casa do Povo
Para além da vertente social, cultural e desportiva, a Casa do Povo tinha também uma função assistencial. Após o 25 de abril, foi criado um bairro social com 10 casas.
Os moradores têm de pagar uma renda, que é muito baixa. No entanto, estas rendas não são suficientes para a Casa do Povo, enquanto instituição, fazer face à manutenção e prevenção da degradação dos edifícios. Salienta a necessidade de as rendas serem razoáveis e conforme a economia atual. Desta forma, poderiam contribuir para a manutenção do edifício.
Este bairro surgiu como resposta a condições socioeconómicas que hoje são muito diferentes, e a Casa do Povo já não tem a função assistencial que tinha, que agora é da responsabilidade das Câmaras.
Havia umas casas ao lado da Casa do Povo, que eram duas casas que ainda existem. Estas casas eram também armazéns.
Recursos
A recolha e incorporação de testemunhos orais foi elaborada por Ivonne Herrera Pineda, com base em conversas, entrevistas e um encontro público e coletivo (2023).
Para citar este trabalho:
Arquitectura Aqui (2024) Testemunho de Carlos Videira, Pinhel. Acedido em 23/11/2024, em https://arquitecturaaqui.eu/documentacao/notas-de-observacao-ou-conversacao/35846/testemunho-de-carlos-videira-pinhel