Tribunal Judicial de ArganilPalácio de Justiça da Comarca de Arganil
Em Março de 1971, o arquiteto José Manuel Pinheiro Rocha, a serviço da GEFEL — Gabinete de Estudos e Empreendimentos Técnicos SARL, firma sediada em Lisboa, apresentou projeto para a construção do Palácio de Justiça da Comarca de Arganil. Na Memória Descritiva, lemos que:
"Os condicionamentos de caráter geral impostos pelo programa base e as características do terreno ao dispor, particularmente no acidentado movimento topográfico, determinaram os princípios da solução apresentada. (...) Este enquadramento obrigou-nos portanto, a tentar uma solução volumétrica, que embora integrada no movimento geral dos condicionamentos topográficos, guardasse uma escala bem definida que não destruísse o Palácio de Justiça ou o comprometesse como objeto representativo duma dignidade."
Novas versões do projeto foram apresentadas em 1973 e 1975 pelo arquiteto António Abrantes, também a serviço da GEFEL, contemplando alterações resultantes dos pareceres do Ministério da Justiça, do Ministério das Obras Públicas e da Comissão Instaladora dos Serviços. O átrio principal, inicialmente previsto para ser "totalmente aberto, era susceptível de provocar correntes de ar" e acabou por ser envidraçado nas novas versões do projeto. Ampliou-se a zona destinada ao público, alteram-se acessos, reorganizou-se o posto de detenção e as celas, além de outros ajustes menores. O projeto de execução foi elaborado em Abril de 1976 e a obra foi finalizada no início dos anos 1980.
Até a construção do Palácio de Justiça da Comarca de Arganil, os serviços do tribunal funcionavam no edifício dos Paços do Concelho, de acordo com vários depoimentos dos moradores: "o Tribunal tinha a sala de audiências do outro lado" (Evento "Memórias Fotográficas de Arganil", 2023). Isto também foi apontado em conversas informais, salientando a multiplicidade de utilizações do edifício da Câmara municipal. Assim disse a professora Olívia Nogueira: "Aqui nesta zona [a Câmara municipal] havia a cadeia e o tribunal [...] o tribunal agora tem edifício próprio, mas chegou a funcionar na Câmara". O seu interlocutor na conversa, o Sr. Lino Borges respondeu: "durante muitos anos, eu ainda me lembro disso, na Câmara".
Notes
Concebido no fim do Estado Novo, já durante o governo de Marcello Caetano, o projeto do Tribunal Judicial de Arganil, realizado por arquitetos a serviço de uma empresa de engenharia, é, em termos expressivos, uma realização que revela a mudança gradual das matrizes e referências arquitetónicas para este tipo de programa durante o período. Nele, não se identificam ecos das composições rígidas de feição neoclássica ou art déco comuns em edifícios dedicados à Justiça durante o salazarismo, substituídos pela expressão também sóbria e pesada do betão aparente que procura relacionar o edifício com a morfologia do terreno. Uma vez que a elaboração e revisão do projeto foi atravessada pelo 25 de Abril, notam-se nas alterações alguma preocupação em tornar o edifício mais aberto ao público e mais transparente, além de assegurar melhores condições nos espaços dedicados à detenção provisória dos réus e condenados.
De acordo com testemunhos de Olívia Nogueira e Lino Borges Gonçalves, moradores e conhecedores de Arganil, o antigo tribunal estava localizado na Câmara Municipal de Arganil:
- Olívia Nogueira: "E para isto [Câmara] ser construído, todas as outras casas foram deitadas abaixo. Aqui nesta zona havia a cadeia e o tribunal. Então tudo isto, mesmo assim, o tribunal agora tem edifício próprio, mas chegou a funcionar na Câmara.
- Lino Gonçalves: Durante muitos anos, eu ainda me lembro disso, na Câmara [estava o tribunal].
- Olívia Nogueira: Chegou a funcionar na Câmara”.
Durante o evento "Memórias Fotográficas de Arganil" (2023), foi descrito o interior do edifício dos Paços do Concelho, que albergava o antigo tribunal, o que reflecte a falta de presença física do tribunal como um edifício reconhecível e separado do resto. No edifício dos Paços do Concelho funcionavam vários serviços, incluindo o tribunal, pois estavam concentrados lá até à conclusão da obra.
Um participante do evento também fez uma descrição do interior do edifício dos Paços do Concelho e dos serviços que albergava: perto do registo civil e
registo predial, "voltava-se por outra porta, entrava-se no Tribunal que tinha a
sala de audiências do outro lado. No primeiro andar, à esquerda, estava o
gabinete do Sr. Frederico, que era o juiz dos pequenos delitos (que eram os delitos
que não iam ao Tribunal, mas à mão do Sr. Frederico, que era o administrador do
Concelho) e ele tinha um ajudante também, que aplicava os castigos de multas
pequenas".
O Tribunal Judicial de Arganil é um dos principais equipamentos construídos ao longo da Avenida José Augusto Carvalho, aberta entre os anos 1950 e 1960 sobre a Ribeira dos Amandos, "viria a constituir a nova centralidade arganilense." (Ventura e Anacleto, 2009, p.85).
Hoje (2023) esvaziado de parte das suas funções em consequência da recente reorganização administrativa dos serviços de Justiça, o Tribunal Judicial de Arganil funciona como conservatória e foi objeto de obras de requalificação que resultaram no revestimento das fachadas em betão aparente, que foram cobertas com material isolante e revestidas.
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Documentation
A informação constante desta página é fruto do trabalho de Diego Inglez de Souza em fevereiro de 2024 e de Ivonne Herrera Pineda em outubro de 2023 e abril de 2024, e foi reunida através de fontes documentais e bibliográficas e dos diversos contributos e testemunhos que pudemos recolher em Arganil. Conta com a preciosa informação partilhada por Olívia Nogueria, Lino Borges Gonçalves e pelos vários participantes do evento “Memórias Fotográficas de Arganil” realizado em setembro de 2023 na Biblioteca Municipal de Arganil, com a colaboração do Arquivo Municipal de Arganil e a Biblioteca Municipal de Arganil, sobre o tema dos edifícios públicos do século XX de Arganil.
To quote this work:
Arquitectura Aqui (2024) Tribunal Judicial de Arganil. Accessed on 21/11/2024, in https://arquitecturaaqui.eu/en/buildings-ensembles/2101/tribunal-judicial-de-arganil