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Testemunho de Adelino Bernardes, Montalegre

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Testemunho de Adelino Bernardes, Montalegre

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Registro de la Observación o Conversación

Conversa com Adelino Bernardes, engenheiro, Técnico da Direção Regionai Agricultura e Pescas do Norte. Conversa mantida no seu gabinete em Montalegre, com as investigadoras Catarina Ruivo e Ivonne Herrera, em outubro de 2023.

Edifício da Direção Regional de Agricultura de Trás-os-Montes

É um edifício de prestação de serviços aos agricultores. Onde hoje, infelizmente, praticamente não tem quase ninguém, mas é uma  casa onde chegaram a estar mais de 30 técnicos entre engenheiros técnicos e licenciados. E também alguns administrativos. Hoje, da Direção Regional só estão cá os administrativos. 

Aqui estão os administrativos e um técnico. 

Este é o edifício chamado a Zona Agrária do Barroso, embora já não seja. Já foi Zona Agrária do Barroso, hoje é uma dependência da Delegação de Alto Trás-os-Montes que tem a sede em Chaves. 

E este no fundo tem ao longo dos anos - inicialmente dava apoio técnico aos agricultores. Tinha técnicos aqui que faziam inspeção à produção de batata de semente. Portanto, a certificação passava por aqui. Eu lembro-me que em 86 ou 87 - e durante mais anos - havia neste edifício para certificação da batata, 8 técnicos, que faziam equipas de 2, com o concelho dividido em 4 partes.

Entretanto, a batata semente foi perdento terreno, como se costuma dizer. E os técnicos foram diminuido, alocados a outras atividades, outros reformaram-se. Faziam-se aqui as candidaturas aos subsídios, que hoje também já não se fazem nos serviços, fazem-se nas organizações de agricultores. E era essencialmente isso. Prestar apoio aos agricultores. E, se bem podemos dizer, fazer alguma extensão rural. Porque não era só o apoio administrativo, era também o apoio técnico. Levar inovações aos agricultores e apoiá-los na reconversão do sistema tradicional agrícola para um sistema depois preconizado pelo Ministério da Agricultura.

Centro Experimental - Quinta da Veiga

O Centro Experimental era por excelência o local mais importante para se fazer experimentação em agricultura de montanha. Aquilo que se fazia ali, primeiro era mostrar, dar o exemplo. A rotação cultural preconizada para a montanha, que era aquilo que a gente propunha aos agricultores, era cumprida religiosamente no Centro Experimental. Qualquer agricultor podia vir ali ver como é que se fazia. E tínhamos, além da batata, a produção de cereal, centeio, que também tinha a sua importância (...), era importante para fazer o pão, algum vendia-se. É uma coisa que depois deixou de ser assim, com a modernização da agricultura, deixou de ser tão importante o uso do centeio para as camas do animais.

Havia uma ligação muito grande entre todos. De facto, naquela altura, aqui em Montalegre (...) Era usual (...) os serviços agrícolas, o Ministério da Agricultura através da Zona Agrária, a Câmara, a Cooperativa, estarem sempre todas juntas. Portanto, os agricultores sentiam que aqueles que os podiam apoiar estavam todos a falar da mesma maneira. Ao falarmos todos na mesma voz, as pessoas tinham confiança e iam aderindo. Depois também alguma vontade de ter os seus projetos de investimento aprovados e portanto respeitar determinadas regras. Mas essencialmente era isso. Eles tinham ali quem os apoiava e que não havia dúvidas, era tudo igual.

Eu recordo-me que em 87, eu tinha vindo para aqui em 86 - já tinha vindo antes que tinha feito aqui estágio em 83 - Em 87 fizemos um dia de demonstração. Aí sim englobados num programa maior que era um programa do Ministério da Agricultura que se fazia um dia de demonstração em vários sítios. No caso em Trás-os-Montes fizemos em 4 ou 5 localidades. E uma delas foi aqui em Montalegre, no Centro Experimental do Barroso. Precisamente para fazermos a demonstração - para os agricultores irem ali ver. Fizemos uma mobilização. Nós aqui nestes serviços, a cooperativa apoiou e a Câmara apoiou. A CMM disponibilizou - aquilo era um dia inteiro, em que estavam constantemente a chegar autocarros. 50 pessoas, as pessoas saíam. E nós tínhamos o espaço todo dividido em estações. Em cada estação havia alguém que explicava o que é que aquilo era que estava ali. Por exemplo, ao lado de um prado, explicava o que era o prado. Ao pé da batata, como é que se fazia. E vieram quase 2000 pessoas, bem, uma coisa impensável naquela altura. Nós aproveitavamos os presidentes das juntas e os padres para serem os nossos difusores da informação. Toda esta gente contribuiu, daí o exito que aquilo foi. A Câmara disponibilizou os transportes, porque nós aqui fizemos esse trabalhinho. Tem que sair um autocarro às tantas horas, para cobrir o concelho todo. (...) Toda a gente contribuiu para isso!  Tudo o que nós tinhamos de mandar para fora, era sempre através do presidente da junta e do pároco. O presidente da junta, normalmente (...). E o padre lia na Igreja! Depois à saída da Igreja começavam logo a conversar uns com os outros. E com isto tudo, se calhar quase sem dar por ela, eu estava a involver toda a gente.

Tudo aquilo que não estava a ser utilizado pelos nossos serviços, mandamos entregar tudo às finanças. No caso concreto, a Câmara está interessada em recuperar para alguma finalidade diferente nalgumas partes, mas não deixando de lado a possibilidade de continuar a fazer ali experimentação e demonstração para os agricultores. (...) Centro de Formação. Aquele local foi um Centro de Formação Profissional para Agricultores. Deixou de ter utilidade - a certa altura foi decidido que a formação passava a ser dada pelas organizações de agricultores. E no caso dali até foi interessante porque na altura o Ministério da Agricultura fez uma cedencia de comodato com a cooperativa e eles ficaram com aquele espaço, temporariamente, e durante alguns anos e faziam formação lá. Bem, deram continuidade no espaço, embora não fosse o Ministério eram eles. 

Isto funciona muito por dinheiros comunitários. Há ali um período em que não há dinheiro comunitário para os cursos e as coisas param. Só lá ficaram as pedras. E a Câmara e bem decidiu que seria um local importante, até pelo que diz às pessoas, recuperar para já alguns daqueles edifícios para serem o Centro do Património Agricola Mundial.

Os edificios todos faziam muito bem a sua função. Foram feitos de uma forma (?) até por isso têm um valor muito interessante. Quando deixou de haver lá técnicos a funcionar, aquilo foi tudo vandalizado. Neste momento existem as pedras, as paredes, o telhado e pouco mais. Isto estava tão bem concepcionado que aquilo tinha um estábulo, vários armazéns, espaços para outro tipo de animais, tinha uma (?) para se colocar (?) e tinha duas casas. Numa casa vivia o tratador de animais - que era no prolongamento do estábulo (descrição sobre a imagem) - e depois havia outra casa [...] Isto não, isto era a eira, para se .. os cereais. Deste lado é ao abrulhador. Esta era a casa do guarda. Depois, tudo isto, era a litreira. Ali aquilo depois foi transformado em viteleiro e depois mais tarde em pocilga. Aqui assim era o abrulhador. 

O abrulhador. aquele edifício era o local que quando a batata vinha para ser plantada, punha-se em tabuleiros a abrulhar (sairem os grelos) para irem já para o campo com grelo grosso e curto. E na parte de baixo do edifício tinha as brulhas, que eram tipo vários armazéns para se recolher a batata que vinha do campo e ia para ali. Porque depois, tinha que passar pelo processo de calibração. [...explicações de agricultura].

Isto nasceu para ser um Centro Experimental e alguém definiu esta área, que se pensa não era toda, mas a maior parte era área baldia. Portanto o estado pegou nisto - por isso é que a Câmara diz que isto nos devia ser dado, porque era nosso - e entretanto o Governo daquela altura decidiu que isto era para o centro experimental e pronto, naquela altura, era mesmo como eles queriam.

E agora já foram deitados abaixo alguns. Daquele lado havia uma pocilga, nova, que entretanto foi deitada abaixo. E havia um armazém muito grande também que também deitaram abaixo.

Naquela altura a pedra não era tratada cá, por isso ela veio de fora. Ainda nos anos 80 nós não tínhamos aqui quem tratasse da pedra.

A partir dos anos 80 passaram a ter tudo e alguma coisa melhor ainda do que aquilo [os agricultores]. Porque aquela era o melhor para a época. (...) Sim e aquilo tinha umas - já as janelas eram basculantes - ainda se veem as janelas [...] As janelas foram todas mandadas fazer por mim. Porque quando eu vim já estavam deterioradas. Quando vim convenci o diretor regional a dar-me dinheiro para as fazer. Foram feitas aqui por um senhor que era o melhor carpinteiro.

Outras questões- Produção

Historicamente a batata semente teve um período áureo. Como disse antes tinhamos 8 técnicos [no edifício da Direção Regional de Agricultura de Trás-os-Montes] a certificar a batata que os agricultores plantavam e produziam com a intenção de ser certificada para batata para semente. Ora bem. Nunca o concelho dependeu apenas da batata de semente ou da batata em si. A grande vocação do concelho de Montalegre, do Barroso, é a produção animal. A produção animal extensiva que produz animais, quer seja ovinos, caprinos, até suínos e bovinos, mais propriamente, que tem altissima qualidade. Aliás, a qualidade conhecida, até com a atribuição de denominações de origem - ao bovino barrosão - e inidcações geográficas protegidas ao...etc. (...) A produção animal foi sempre o expoente máximo. Aliás, Há decadas atrás, o principal produto mercantil do concelho era precisamente os bovinos. Por uma razão muito simples. Porque nós estamos aqui isolados, porque havia muitas dificuldades nas acessibilidades, e era o único produto que se auto-transportava.

Mais tarde é que é introduzida a batata para semente - o ouro branco do concelho - porque naquela altura foi importante, até para criar melhores condições de vida às familias agricultoras. Foi nessa altura que até começou essencialmente os telhados de colmo a serem substituídos por telha cerâmica. Veio o ouro branco, porque de facto trazia um rendimento muito grande às famílias agricultoras.

Outras questões

Começamos a perceber que o Estado não dá para tudo. E às vezes até consegue ser melhor a fazer do que a conservar. 

A nossa indústria é pouca ou nenhuma, o comércio é, eu costumo dizer que não cria riqueza. Porque se andarmos a trocar o dinheiro entre nós, não aumenta. Pode estar mais na minha mão ou na vossa, mas não aumenta. Portanto o que nos resta, de facto, é a agricultura. Mas, mesmo aí, começo a ficar com alguma preocupação, por causa - saiu muito jovem, e depois houve aqui um período - felizmente parece que a curva está a inverter - houve aqui um período em que nasciam muito poucas crianças, e algumas das que nasciam depois não ficavam aqui, iam embora. Agora parece-me que, nos últimos dois anos começou a inverter.

É que de facto, tirando a agricultura, para já não estou a ver grandes coisas. 

A batata de consumo começa hoje - vamos ver o que é que vai dar porque isto está tudo no principio, começa hoje a ter algumas prespetivas para além da batata de semente, que era a mais importante. Porque há alguns hipermercados que perceberam, algumas caideias, que a nossa batata não é só fama, é de facto batata de grande qualidade. E, propoem-se pagar já um preço que poderá ainda melhorar mas que já é razoável, e com garantias de uma coisa que nós nunca tivemos - que é o pagamento no prazo x. (...) Muita da batata de consumo é proveniente dos calibres grandes da produção de batata de semente. A batata é uma atividade vegetal interessante porque em 3, 4 meses faz-se. Mas o investimento é muito grande. (...) Se o agricultor estiver um ano à espera do dinheiro, isto não lhe dá lucro. (...)

Para citar este trabajo:

Arquitectura Aqui (2024) Testemunho de Adelino Bernardes, Montalegre. Accedido en 31/10/2024, en https://arquitecturaaqui.eu/es/documentacion/notas-de-observacion-o-conversacion/28023/testemunho-de-adelino-bernardes-montalegre

Este trabajo ha sido financiado por European Research Council (ERC) – European Union’s Horizon 2020 Research and Innovation Programme (Grant Agreement 949686 – ReARQ.IB) y por fondos nacionales portugueses por intermedio de FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., en el contexto del proyecto ArchNeed – The Architecture of Need: Community Facilities in Portugal 1945-1985 (PTDC/ART-DAQ/6510/2020).