Testemunho de Graça Moniz, Arganil
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Testemunho recolhido numa conversa com Graça Moniz, na Biblioteca Municipal de Arganil, em maio de 2023, com a investigadora Ivonne Herrera Pineda.
Graça Moniz durante décadas foi professora de primária, inicialmente em Funchal, depois em Pampilhosa da Serra e desde o ano 1980 até 2013 no concelho de Arganil. É presidente do Grupo Folclórico da Região de Arganil, onde participa ativamente.
Do projeto Arquitectura Aqui expressamos os nossos sinceros agradecimentos pela sua generosidade em conversar connosco e e abrir-nos as portas do museu do Grupo Folclórico da Região de Arganil.
Escola primária de Casal de São José, Arganil
A escola de Casal de São José foi construída na década de 1930 pela Comissão de Melhoramentos local, criada em 1933. Depois de construída e totalmente mobilada, foi entregue ao Estado. No ano 2000 foi fechada por ter menos de 10 alunos. Atualmente é a biblioteca e museu do Casal de São José, onde se encontram peças etnográficas da aldeia.
Outras questões - Escolas e educação
Seguem-se algumas partes desta entrevista onde podemos compreender como era a educação na região de Arganil durante o século XX:
"Todas as aldeias praticamente tinham escola. Eu vim para Arganil em 1980 e lembro-me de que a grande maioria das aldeias naquela altura ainda tinha escola. E alguns com dois professores a trabalhar, o que significava que tinham que ter mais que 22 alunos. Mas se recuarmos a 1960, de 60 para trás, ainda eram muito mais, porque as famílias tinham em média 7 ou 8 filhos”.
“A época que tu estás a reportar, 1939 -e não vamos estender até 85. Vamos ficar ali por 1960 - de1939 a 1960- portanto neste período de 21 anos, as mulheres se fizessem a terceira [classe] já era muito bom, porque elas tinham que ajudar as mães na lida da casa e cuidar dos filhos mais novos, dos irmãos mais novos. Os rapazes, uma grande parte, já conseguia chegar à quarta classe. Mas depois havia a política familiar, digamos assim, ou filosofia familiar, chamemos-lhe o que quisermos: se havia uma família de sete irmãos, por exemplo, e o mais velho não tinha passado da quarta classe, os outros também não passavam, por mais inteligentes que fossem.
Por mais que os professores (na altura os professores primários), os padres (sacerdotes) -que tinham muita influência na aldeia – eles podiam pedir a todos os santos e mais alguns para os meninos irem estudar, mas se os mais velhos não tivessem estudado, aqueles também não [iam]. As raparigas era quase caso raro saírem da aldeia para irem estudar. Havia a filosofia de que a rapariga era formatada, porque é mesmo o termo, era “formatada” para trabalhar em casa, para casar, para ter filhos, tratar dos filhos e costurar”.
Outras questões - Comissões de Melhoramentos
Graça Moniz ressalta que o desenvolvimento nas aldeias e áreas do interior se deve à ação de diversos agentes sociais que foram unidos pela ideia do regionalismo. As ideias de progresso como as escolas, ou a canalização chegaram de vários atores sociais. Entre eles, famílias abastadas, cujos filhos já estudavam até a quarta classe e iam estudar nos seminários, onde expandiam o seu mundo e levavam novidades para as aldeias. Outros atores muito importantes são os migrantes que vão para Lisboa trabalhar e também trazem novidades e consideram necessário expandir o mundo através da educação. Esses atores têm um papel determinante nas Comissões de Melhoramentos.
“E estas Comissões de Melhoramento tiveram realmente um papel muito importante. Todas as terras, como digo, tinham escola, a escola primária. Todas tinham escola primária, porque criou-se a ideia importantíssima de que toda a gente devia pelo menos saber ler e escrever nas aldeias e para isso era preciso haver professores. E tínhamos muitos professores a trabalhar aí em condições às vezes muito difíceis, mas a trabalhar nas aldeias. E isto acontece até 1980 e poucos”.
Outras questões - Telescola
“Porque quando eu vim para Arganil em 1980, a grande maioria das aldeias do concelho de Arganil tinha escola primária. E havia algumas escolas, em 1980, havia algumas escolas que tinham a chamada Telescola, que era a escola pela televisão, [cujas] aulas eram nos estúdios do Monte da Virgem da RTP no Porto, em Vila Nova de Gaia, e transmitidas pela televisão. As aldeias que eventualmente – aqui no concelho de Arganil acho que já quase todas tinham eletricidade, mas as que não tivessem, tinham um gerador que produzia a eletricidade para que a televisão funcionasse. E as aulas eram [transmitidas] na parte da tarde, o professor primário que trabalhava de manhã na escola primária, à tarde era o monitor da telescola”.
Outras questões - Reutilização das escolas
“A maior parte das escolas que temos no concelho, hoje estão, como disse, entregues a essas comissões e são museus dessas comissões, ou estão ocupadas por casas de convívio”.
Outras questões - Grupo Folclórico da Região de Arganil
O Grupo Folclórico da Região de Arganil representa uma época etnográfica e cultural que vai do final do século XIX até o primeiro quartel do século XX. O grupo fez atuações em várias partes do mundo, como a Dinamarca, a Áustria, a França, a Bélgica, o Luxemburgo, a Itália.
O Grupo Folclórico recolhe informações sobre as tradições populares, como canções e danças populares ou artesanato antigo. Nas suas instalações, têm um museu com vários exemplares de grande valor etnográfico e cultural, como uma galera antiga, que foi o primeiro transporte coletivo de Arganil.
Outras questões- Migrações
Todo o concelho possui uma vasta população que emigrou para Lisboa nas décadas de 20, 30 e 40 devido à falta de condições e perspetivas de vida nas aldeias, que eram muito pobres e dependiam principalmente da agricultura manual. As pessoas não tinham capacidade financeira para sair da região, então viviam e morriam nas suas próprias terras.
A recolha e incorporação dos testemunhos orais foi elaborada por Ivonne Herrera Pineda, com base numa entrevista semi-estruturada realizada em maio de 2023.
Para citar este trabajo:
Arquitectura Aqui (2024) Testemunho de Graça Moniz, Arganil. Accedido en 21/11/2024, en https://arquitecturaaqui.eu/es/documentacion/notas-de-observacion-o-conversacion/31796/testemunho-de-graca-moniz-arganil