Centro de Saúde, Montalegre
A necessidade de um equipamento de saúde que servisse o concelho de Montalegre sentia-se desde, pelo menos, a primeira metade da década de 1960, quando se planeava a construção de um hospital na vila Montalegre. Pensado para servir um concelho amplo e urbanamente disperso, este deveria ter relativa autonomia, prevendo-se serviços de medicina geral, cirurgia geral, maternidade, pediatria, consultas de estomatologia, otorrinolaringologia e oftalmologia. Embora os estudos para o hospital tenham avançado e, em 1964, a Direção-Geral dos Serviços de Urbanização tenha proposto um terreno para a sua implantação à Câmara Municipal de Montalegre, a obra não avançou. O bloqueio poderá ter sido financeiro, já que, em 1962, a Direção-Geral dos Hospitais se manifestava incapaz de comparticipar mais do que 50% da obra, caindo o restante investimento sobre a autarquia.
Só mais de uma década depois arrancaria um novo plano para a construção de um equipamento público de saúde em Montalegre, agora um centro de saúde, integrado num projeto de cooperação entre Portugal e a Noruega, que se seguiu a um pedido de Portugal de apoio para a saúde em 1976.
Entre 1976 e 1979, quando o acordo de cooperação foi oficialmente assinado e publicado no Aviso de 28 de dezembro, um grupo de especialistas dos dois países estudou, discutiu e formulou objetivos e estratégias. Em 6 e 7 de março de 1978, a 7ª reunião da Comissão Económica Mista Luso-Norueguesa definiu um Protocolo relativo ao apoio norueguês a Portugal, que incidia sobre várias áreas de desenvolvimento, entre elas o setor da saúde. Neste âmbito, o plano acordado tinha como objetivo o desenvolvimento de um serviço de primeiros cuidados em Portugal, focando-se, de acordo com a política da Agência Norueguesa para o Desenvolvimento Internacional (NORAD), numa região pouco desenvolvida de Portugal - o distrito de Vila Real. Este programa incluía a reconstrução e alargamento do Hospital do Lordelo, em Vila Real, e a construção de uma escola de enfermagem a este associada; a construção de cinco centros de saúde em Boticas, Ribeira de Pena, Santa Maria de Penaguião, Vila Pouca de Aguiar e Montalegre; a construção de 15 extensões de saúde; o estabelecimento de dois departamentos de clínica geral localizados na Faculdade de Medicina e no Instituto de Ciências Biomédicas do Porto; um programa de bolsas de estudo. O Governo norueguês prestaria apoio financeiro com 100 milhões de coroas norueguesas, das quais metade em forma de doação e outra metade como empréstimo sem juro, e participaria como entidade consultora.
Entretanto, em janeiro de 1978, ainda antes da assinatura do acordo entre os dois países, o projeto para o Centro de Saúde de Montalegre foi atribuído a um gabinete de arquitetura sediado no Porto, não tendo a Direção-Geral das Construções Hospitalares a possibilidade de elaborar todos os projetos incluídos no programa. Um documento desta Direção-Geral, de julho de 1978, revela que foi decisão do Secretário de Estado das Obras Públicas entregar os projetos a equipas do norte. O mesmo documento indica que o anteprojeto sofria de “graves deficiências”, tendo sido reprovado, re-submetido e finalmente aprovado em setembro do mesmo ano.
Em janeiro de 1979, dois meses após a transição do 3º para o 4º Governo Constitucional, em reunião de diretores gerais e responsáveis dos serviços centrais da Secretaria de Estado da Saúde, o Secretário de Estado expôs um conjunto de orientações de caráter técnico e financeiro que deveria ser seguido para revisão do programa de construção de centros de saúde. Estas orientações estabeleciam que, sempre que possível, os centros de saúde deveriam ser instalados em edifícios existentes e que cada centro de saúde, para 15.000 a 20.000 habitantes, não deveria exceder o custo de 5.000.000$00. Em sequência, de acordo com ofício do Ministério dos Assuntos Sociais da mesma data, criou-se um grupo de trabalho para a elaboração de propostas alternativas, menos dispendiosas que as previstas pelo anterior governo, revendo “os programas e projectos dos Centros de Saúde, entre os quais Montalegre, do Distrito de Vila Real (…) tendo em vista uma possível redução de áreas, uma maior funcionalidade e humanização dos Serviços, economia de construção e manutenção”. Entretanto, por orientação do Secretário de Estado da Saúde, “foi suspensa a construção de todos os novos centros de saúde, a criar de raiz […] incluindo as de proveniência externa, designadamente dos programas de cooperação dos EUA e da Noruega”.
Foi, assim, suspenso o projeto de construção do Centro de Saúde de Montalegre. A decisão foi noticiada em vários jornais a 2 de fevereiro de 1979, onde se anunciava também a ameaça de demissão por parte de vários presidentes de câmara nas autarquias afetadas, incluindo Boticas, Vila Pouca de Aguiar e Montalegre.
Não é claro quando e de que forma é que a suspensão foi levantada. Em julho de 1980, foi aprovado um projeto profundamente remodelado para o Centro de Saúde de Montalegre e, em março de 1981, iniciaram-se as obras de construção. A 1 de abril de 1981, a Câmara Municipal de Montalegre teceu um voto de reconhecimento à comunicação social:
“(...) com destaque para o jornal “O Comércio do Porto”, a Rádio Televisão Portuguesa, a ANOP e a Rádiofusão. O Comércio do Porto, através do seu delegado em Vila Real publicou pequenas entrevistas com o Presidente da Câmara que deram impacto a nível nacional e muito contribuíram para uma defesa pública e generalizada da causa do Centro de Saúde de Montalegre. […] Da mesma forma a ANOP, dando seguimento a todas as informações recebidas da Câmara Municipal, cumpriu exemplarmente neste acto de intransigente defesa dos interesses desta desfavorecida e sempre desprezada região de Barroso.”
Apesar das alterações introduzidas no projeto, o custo estimado do Centro de Saúde de Montalegre tinha, em janeiro de 1981, aumentado de 89.000.000$00 para entre 114.000.000$00 e 151.000.000$00, sendo o espaço projetado considerado demasiado amplo pelos técnicos noruegueses. No mês seguinte, estimava-se o custo final provável do Centro de Saúde de Montalegre em 153.956.000$00, acompanhando o crescimento geral dos orçamentos para as construções previstas no programa de apoio norueguês. Em janeiro de 1983, o apoio financeiro da Noruega foi aumentado em quatro milhões de coroas.
Pela mesma altura, a equipa local da Direção-Geral das Construções Hospitalares propunha rescisão de contrato com a firma adjudicatária da obra. Explicavam ter verificado corte de água no estaleiro, falta de materiais essenciais, aquisição de materiais em quantidade insuficiente, utilização de materiais não aprovados e atrasos na obra com consequências para a sua manutenção. Descreviam que, “um ano após o início da obra, a equipa de fiscalização começou a sentir um mau ambiente nas suas deslocações à mesma, pois o adjudicatário começou a deixar de cumprir os seus compromissos financeiros perante trabalhadores, fornecedores e subempreiteiros, bem como relativamente a um certo número de habitantes da Vila de Montalegre que lhe prestaram diversos serviços”. Uma visita à obra em janeiro de 1983 permitiu “concluir que se estava a atingir uma situação em que não era possível prever a sua conclusão a médio prazo”. Depois de sucessivas prorrogações de prazo, na visita à obra de julho do mesmo ano, constatou-se a quase paralisação dos trabalhos, e na visita de agosto, percebeu-se que a empresa “tinha retirado algum do pessoal que na visita anterior se encontrava em obra, que não tinha chegado qualquer material à mesma (…) e que a firma sub-empreiteira de instalações eléctricas e mecânicas continuava ausente da obra”. Face a esse cenário, propôs-se a rescisão do contrato. Na visita à obra de novembro, “a Equipa de Fiscalização foi impedida de entrar na mesma pelos trabalhadores (…), que se encontravam mais uma vez em greve desde o dia anterior, pois que desde o passado mês de Agosto (inclusivé) que os mesmos não recebiam os seus salários”.
Após rescisão do contrato em 1984 e entrega da obra a nova firma, o Centro de Saúde de Montalegre foi inaugurado em setembro de 1985.
Notas
O Centro de Saúde de Montalegre foi construído no âmbito do Programa de Cooperação com a Noruega no Setor da Saúde, de 1979. Este programa incluiu a construção de vários equipamentos de saúde no distrito de Vila Real, incluindo as Extensões de Saúde de Salto e Ferral, no concelho de Montalegre, e Pópulo, Balsa e Chã, no concelho de Alijó).
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A informação constante desta página foi redigida por Catarina Ruivo, em janeiro de 2024, com base em diferentes fontes documentais e bibliográficas e na legislação relevante.
Para citar este trabajo:
Arquitectura Aqui (2024) Centro de Saúde, Montalegre. Accedido en 09/11/2024, en https://arquitecturaaqui.eu/es/edificios-y-conjuntos/1501/centro-de-saude-montalegre